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O GRANDE ORIENTE DO BRASIL E O CENTENÁRIO DA INDEPENDÊNCIA (VI) – A PERSEGUIÇÃO DE LEDO

A PERSEGUIÇÃO DE lEDO
Sua enérgica representação a D. Pedro I
Amaro Arthur Albuquerque *
Visando algum trabalho de Irmão para a Semana da Pátria,
O Irmão Hélio Pereira leite, ex-Grão-Mestre do GOB/DF
Selecionou vários textos originários dos Boletins do GOB.
Este é o quinto da série:
helio.p.leite@gmail.com
3 – O Grande Oriente do Brasil e o Centenário da Independência (VI)
A Perseguição de Ledo – (pesquisa de Helio P. Leite)
JB News – Informativo nr. 1.789 – Florianópolis (SC) segunda-feira, 24 de agosto de 2015 Pág. 6/28
Passou em 2 de novembro vigente o centenário da enérgica representação que, em 1822, o patriarca da Independência do país, nosso inesquecível Ir.’. Joaquim Gonçalves Ledo, dirigiu a D. Pedro 1º . então Imperador do Brasil, pedindo-lhe mandasse instaurar processo contra sua pessoa.
Motivou essa representação o fato de Ledo, em fins de Outubro, estar sendo terrivelmente perseguido pelo Ministério. E a causa de tal perseguição, foi, em resumo, a seguinte:
Ledo e seus amigos atacavam, pelos jornais, certos atos do Ministério, além de os reverberar em palestras, transmitidas, por bajuladores mexeriqueiros, ao Presidente do mesmo, que começou logo a agir.
O jornalista João Soares Lisboa, Redator do “Correio do Rio de Janeiro” , sofreu o primeiro golpe de vingança do Ministério. À 20 do citado mês recebeu ele ordem de suspender a publicação do seu jornal e de se retirar, imediatamente, do Império, no vapor que estivesse a partir para a Europa! Insinuaram a Clemente Pereira solicitasse exoneração do cargo de Presidente do Senado da Câmara! Mandaram o padre Lessa se afastar da Capital! E dois coronéis e diversos oficiais tiveram comissões fora desta.
Ledo e os Maçons não pouparam as novas violências do Ministério, deportando, sem processo algum, brasileiros dignos, cujo crime único era não lhe tecerem ditambos.
“ Houve quem fosse dizer a José Bonifácio que os partidários de Gonçalves Ledo e de Clemente Pereira, no dia 23 de outubro, aproveitando a ausência do imperador, que devia ir à Santa Cruz ( e por isso deixou de ir ), pretendiam fazer um pronunciamento, depondo os ministros, que seriam substituídos por Ledo, Clemente Pereira, Januário da Cunha Barbosa e outros. Os denunciantes disseram mais que os revolucionários contavam com alguns comandantes e oficiais da tropa. Todas essa acusações apareceram na devassa, e os acusados foram absorvidos. “ (1)
“(1) Nota de Rio Branco à “História da Independência”, de Varnhagen, pag. 214”
Dai o Ministério descarregar todas as baterias contra seus adversários, determinando ao Intendente Geral da Polícia descobrisse e processasse os “perversos”, que preparavam “tramas infernais”, sendo Ledo, maquiavelicamente acusado de “anarquista e demagogo, que queria subverter a ordem do governo estabelecido, caluniando a indubitável constitucionalidade do Imperador e seus Ministros”.
Em vista disso Ledo se ocultou, em S. Gonçalo, na fazenda do Ir.’. Belarmino Ricardo de Siqueira.
“ A vida de Gonçalves Ledo correu perigo naqueles dias. Os capangas José de Oliveira, Porto Seguro, Miquelina e outros pediam em altas vozes a sua cabeça, e um cônego Thomaz José de Aquino não duvidou declarar, depondo na devassa, que ele testemunha (28 de outubro), pondo-se de pé e em altas vozes, gritou que, se era necessária para salvação de sua pátria e de seus concidadãos a morte de Ledo, ele testemunha naquele mesmo instante lhe ia romper às entranhas, uma vez que lhe perdoassem o assassinato.” (2)
“(2) Nota de Rio Branco à “História da Independência, de Varnhagen, pag. 228.
No dia 29 circulou pela cidade uma proclamação, impressa na Tipografia Nacional, que afirmavam ser de Martim Francisco (Irmão de Bonifácio).
A proclamação falava em vis carbonários, que pugnavam pelo republicanismo, “abusando da boa fé do imperador”, para derramar a discórdia e desgostar os anjos tutelares Andradas, afim de os fazer retirar do Ministério. (3) Havia nela alusão clara a Ledo : “ À testa do rancho infame está um monstro, que, por desgraça, é nosso patrício… um vil… um pérfido, que saudou o decreto desorganizador de 29 de setembro de 1821 com a cerimônia do seu infernal rito.” Também se preocupava com a Maçonaria, cujos trabalhos se achavam suspensos desde o dia 25, mas que seriam reabertos, segundo se dizia : “ Os resultados dos clubs funestos… Feche-os, Senhor ! Tornem os Franklins (sic!) brasileiros para o vosso lado.” Fizeram, igualmente, distribuir essa proclamação, na noite de 30, no teatro, pois Ledo alude a isto em sua representação.
JB News – Informativo nr. 1.789 – Florianópolis (SC) segunda-feira, 24 de agosto de 2015 Pág. 7/28
“ (3) O ministério tinha caído, momentaneamente.
Diante de tanta infâmia e como o Ministério voltasse ao poder, Ledo, indignado, enviou a D. Pedro, do lugar onde se homiziara, a representação a que nos referimos acima. Era ela assim redigida:
“ Senhor
Quando depois de ter servido à causa da minha pátria em geral e a V. M., mesmo com todos os esforços que em mim cabiam, já como simples cidadão, já como procurador geral e conselheiro de Estado desta província do Rio de Janeiro, me comprazia de ter merecido aquela estima que o bom povo da mesma província me testemunhava, conferindo-me há pouco, pela sua absoluta espontaneidade, a honra de me nomear deputado por ela à Assembleia Geral, que deve estabelecer os legítimos fundamentos do Império Constitucional de V. M. sobre este vasto, rico e opulento país, que me viu nascer; quando eu, seguro na augusta palavra de V. M. , que poucos dias antes me dera, de não conceituar rumores, que os meus perversos e gratuitos êmulos de antemão espalhavam contra mim, por meio de homens de mais desacreditada reputação, lançados a esse efeito por todas as boticas e lugares de público ajuntamento – esperava que a minha honra pudesse resguardar os escolhos, que por toda parte me levantava a aguçosa intriga de meu jurados inimigos, – eis que, no dia 30 do pretérito Outubro, vejo sublevar-se contra mim, Senhor, não digo bem, contra o meu nome, conta a minha honra, e com inaudito vilipêndio desses mesmos empregos, que o bom povo de toda essa província me conferira, um motim que não louvarei, dando-lhe o nome de popular, mas sim de uns poucos indivíduos da mais baixa plebe, vendidos à facção dos ditos meus bem conhecidos inimigos, os quais, dirigindo-se em pública assuada às portas do Paço do Conselho desta cidade, ai, com vozes tumultuárias e maneiras descompostas, me arguiram de fautor de um partido que projetava substituir um sistema de forma republicana à atual forma de governo, pela qual tanto trabalhei, e que até em uma voto meu no Conselho de Estado estabeleci como fundamento da segurança interna do Brasil, – acompanhando as suas caluniosas increpações de todas aquelas descomposturas de gestos e palavras ludribiosas, de que apenas nos governos puramente democráticos se poderão contar alguns exemplos, que se ouvem sempre com horror e espanto. A íntima convicção da minha consciência, a certeza que eu tinha da de V. M., que pessoalmente conhece os meus serviços feito à causa da sua aclamação, a que eu julgava no seu mesmo ministério de serviços, cujo plano fora com ele concertado, me recobraram do soçobro, de que a primeira voz de tal acontecimento me deixara impressionado. Mas, qual não devia ser a minha surpresa, quando depois soube que as autoridades públicas desta cidade, em vez de coibirem o tumulto, se mantiveram em pacífica observação de todo o insulto, que ai se quis fazer ao meu e a outros nomes, ousando alguns dos perversos amotinados pedir em altas vozes a minha cabeça e a de alguns varões conspícuos desta cidade, os mais assinalados pelos seus pretéritos e recentes, públicos e inegáveis serviços feitos à causa do Brasil em anteriores ocasiões e na aclamação de V. M. varões, digo, que, sendo constitucionais por caráter, não podiam nem podem, ser taxados senão da impaciência de se sujeitarem a um governo despótico e fórmulas arbitrárias, que servis, sem mérito e sem pejo, quereriam estabelecer, com vergonha eterna do Brasil, e talvez com a perda da união das províncias deste nascente Império, em que deve residir a sua força : declarando guerra a todos os princípios de justa liberdade, contraditando-se nas suas mesma inculpações; acusando, condenando e cuidando dar razão de todos os acontecimentos, com só proferirem as palavras odiosas – “clubs carbonários”.
Qual não foi minha surpresa, outra vez digo, quando, na noite desse mesmo dia 30 de Outubro se espalharam no teatro proclamações do exemplar junto, estampadas na Imprensa Nacional, sem nenhuma assinatura, com ataque manifesto da lei, e na qual, com ênfase grosseira, com irrisórias exclamações, se inculca existir um partido republicano, incutindo-se nos ânimos dos pacíficos
JB News – Informativo nr. 1.789 – Florianópolis (SC) segunda-feira, 24 de agosto de 2015 Pág. 8/28
cidadãos desta Corte o terror e o medo, sem, contudo, dizer-se, neste infame impresso, uma só palavra de Constituição, que nele muito de propósito parece que se fugiu de expressar.
Ah ! Senhor ! Então conheci que os meus perversos êmulos, tendo por fim somente substituir o Governo despótico e arbitrário ao constitucional promulgado, antecipam as épocas de o poderem fazer, pondo já, antes do tempo, em esquecimento a Constituição, enquanto a toda brida perseguem cidadãos constitucionais, que desejam ver bem marcada a linhas dos poderes políticos, bem estabelecida a responsabilidade dos funcionários , e bem firmada a segurança individual e de propriedade, havendo-os por isso, para deles se desapressarem, como republicanos avessos e contrários ao sistema constitucional , que esses mesmos, a quem eles ousadamente inculcam proclamaram, requereram e estabeleceram, com a mais decidida cooperação e eficaz empenho pela inauguração da pessoa de V. M. há vinte dias.
Sim, Senhor ! Eles agermanaram toda a eficácia da sua malevolência com a estúpida prática de meios contrários a seus fins, os quais, deixando entrever o alvo a que atiram, põem em alarma os povos, e os tornam cismáticos, para desabraçarem a causa de nossa política independência, que ainda flutua nos embates de contradição entre os povos das províncias, cuja acessão ao nosso sistema não está geralmente decidida, sem talvez o poderá jamais, sem que uma Constituição liberal os convide a entrar na liga conosco, pois os povos aborrecem o despotismo, e hoje em toda parte só ressoa o grito da recuperação dos seus direitos individuais.
E, se não é isto assim, Senhor, se não são falsos, caluniosos e estupidamente grosseiros os boatos com que os malvados meus êmulos procuram salpicar a minha conduta e a do ilustre presidente do Senado desta cidade, e do brioso ministro da Guerra demitido (4) eles que apresentem o corpo de delito sobre o que assenta sua nojosa e negra inculpação a tal respeito; eles que propalem os documentos, que comprovem a sua infernal urdidura. Não sabe porventura o mais pedante, rábula em matéria e formas de direito que é nula e improcedente qualquer inculpação, uma vez que não existe corpo de delito ? Como, pois, não havendo, nem próximo, nem remoto; como é que tendo o presidente do Senado feito os maiores serviços públicos, endereçados à aclamação de V. M. até o dia 12 de Outubro; como é que sendo V. M. pessoalmente testemunha dos que eu lhe fiz a esse respeito; como é que, não lhe tendo (recorro ao seu alto testemunho) feito jamais a menor prática de intriga, nem soltado uma palavra que atacasse pessoas venerandas; com é que não abusando nunca do acesso, que a bondade de V. M. franqueava ao meu emprego; como é, digo, que surpreendemos a boa fé de V. M. conseguimos derramar cizânia e discórdia e tornar-nos fautores de uma nova forma de Governo, contrário ao mesmo em que havíamos trabalhado, de que fui eu que deu a V. M. a primeira felicitação ? Basta só o acusar ? Basta só vociferar ? Com tal arte, Senhor, nada há que se não possa, proscrever.
“(4) Era o General Nobrega, que no G.”. O.’. exercia o cargo de seu Promot.’. Fiscal.”
Terei eu acaso a virtude plástica de formar repúblicas ? Possuirei o princípio regenerativo de todos os acontecimentos, que na prática se requer, para se elas coordenarem ? Como não alcançam estes inconsequentes que o seu embuste não pode fascinar o espírito da melhor parte do povo que isto conhece ?
As constituições dos Estados republicanos, Senhor, saíram dos gabinetes do despotismo: o sistema opressivo da Inglaterra foi quem erigiu uma república os Estados Unidos da América; a inquisição política da Espanha quem fundou a da Holanda. Estes são fatos históricos; os povos querem ser bem governados e não se importam com formas de Governo. Não pode, portanto, , ter feições de verdade uma tão grosseira calúnia, como a de que hei feito menção. Não posso persuadir-se que os boatos e motim cometido contra a minha pessoa tivessem outro fim que não fosse vilipendiar o meu nome ante os olhos do público.
E devo eu em silêncio sofrer atrocidades de tal natureza, ou seja como cidadão, ou como homem público ? Não, Senhor ! Pode a força privar-me da vida, o da fazenda, que por ora é a que herdei
JB News – Informativo nr. 1.789 – Florianópolis (SC) segunda-feira, 24 de agosto de 2015 Pág. 9/28
de meus pais; mas não da minha honra, que é haver da opinião pública, que eu muito prezo. Toca-me, portanto, defende-la e a V. M. facilitar-me os meios para isso.
Eu desafio os meus inimigos, para que me acusem pelos meios que o direito tem estabelecido: entretanto, dou a todos eles, e a quantos me ousarem suspeitar, por desmentidos solenes e publicamente de quantas inculpações me fizeram. Nos legem habemus: reclamo a lei, reclamo a execução da lei para a acusação e para a defesa; reclamo, para cuidar desta, a imunidade que me concede a nomeação de deputado para a Assembleia Geral do Brasil. – Deixemos os meios , das injúrias, deixemos açõs populares de assembleias tumultuárias, porque estamos nos governos democráticos, que eles temem e cujas práticas excitam. Não é do largo de S. Francisco de Paula (5) que se apura a verdade, que se exercita o foro, açulando a plebe contra o cidadão indefeso: se isso se permite ainda uma vez, mais ficamos em anarquia, que eu desejo remover dos meus lares.
“(5) os ajuntamentos do povo, nos dias de agitação, faziam-se então no largo de S. Francisco de Paula, onde estava então o Senado da Câmara. (Nota de Rio Branco à “História da Independência”, de Varnhagen, pag. 226).”
Requeiro a V. M. mande abrir uma devassa segundo a lei, preenchidos os requisitos da ação criminal, afim de que eu apurar a minha conduta coo cumpre. O público deve ser instruído da verdade em assunto em que se promete o seu sossego: quem for culpado deve ser castigado. A falta deste procedimento deve induzir-nos a crer a inexistência do delito no conceito de V. M. , e então o castigo dos caluniadores deve servir de satisfação à minha inocência ofendida. Eu protesto por ele perante as autoridades, a cujo cargo está o exercício do poder judiciário.
Rio de Janeiro, 2 de Novembro de 1822
O Procurador Geral desta província, Joaquim Gonçalves Ledo.”
A 7 desse mês a “Gazeta”, jornal publicado na Corte, noticiou que se distribuía, gratuitamente, a representação de Ledo. Antes, porém, é, no próprio dia 2 o Ministério lavrou uma portaria, determinando ao Intendente da Polícia que:
“ Sem perda de tempo, houvesse de proceder a uma rigorosa devassa sobre as pessoas já infamadas na opinião pública como facciosas e perturbadoras da ordem, conspirando contra o Governo estabelecido, propagando contra ele atrozes calunias, e pretendendo excitar entre o povo a discórdia e a guerra civil, derramar o sangue dos cidadãos honrados e pacíficos e cavar até aos alicerces a ruina do nascente Império, etc.
Publicou editais a esse respeito com cata de 4, o intendente da polícia, convocando todos os cidadãos honrados e zelosos da tranquilidade pública a virem á sua casa delatar quantos soubessem.
Inaugurava-se deste modo, logo no primeiro mês do Império, um sistema inquisitorial, que nem sequer tinha estado em vigor no Rio de Janeiro durante os treze anos do regime absoluto, que findara no dia 26 de fevereiro do ano precedentes.” (6).
“(6) Varnhagen, “História da Independência”, pags. 226 e 227.”
Então, para se livrar da mesquinha perseguição que lhe movia o Ministério, Ledo resolveu se expatriar.
E embarcou com destino a Buenos Aires, República Argentina, a bordo de um navio mercante da Suécia, prestando-lhe, para tal fim, grande auxílio o Ir.’. Lourenço Westine, Consul deste último país.
*Amaro Arthur Albuquerque, Gr.’. Sec.’. Ger.’. da Ord.’. e Redator-Chefe do Boletim do Grande Oriente do Brasil.
Fonte: Boletim do Grande Oriente do Brasil, Novembro de 1922, pags.1195/1201.
Remetente: Helio P. Leite

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