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Maçonaria e Política: Um Ensaio de Interpretação Libertária

Inspirado pelos atuais posicionamentos políticos que os diversos representantes maçônicos têm tomado diante da sociedade, os quais demonstram relevante falta de unidade e de princípios mais robustos que demonstrem preparo para lidar filosoficamente com o cerne das questões e dos problemas da sociedade, este artigo introduz aos leitores o conceito libertário como instrumento de análise desses posicionamentos e de possível evolução dos maçons enquanto agentes políticos. 

Introdução

O objetivo do presente artigo passa longe de estabelecer qualquer tratado sobre o tema. Pelo contrário, é suscetível a reavaliações e passível de erro.

Todos os cidadãos não inimputáveis são conhecedores, sendo maçons ou não, de vários feitos históricos relacionados a famosos maçons engajados politicamente em ideais de liberdade e democracia, que protagonizaram, ou foram importantes coadjuvantes em diversas independências coloniais, na instituição de repúblicas democráticas, bem como no fim de alguns sistemas escravocratas. Sobre esse tema, José Castellani (2007) indica alguns desses famosos maçons:

(…) nenhum pesquisador imparcial e desapaixonado poderá negar que, entre os principais líderes da libertação das colônias americanas, sobressaíram-se os maçons: George Washington e Benjamin Franklin, nos Estados Unidos da América; San Martin, na Argentina; Simon Bolívar, na Venezuela; Benito Juarez, no México; José Marti, em Cuba; O’Higghins, no Chile; Sucre, na Colômbia (…). Isso sem contar a figura maiúscula do venezuelano Francisco Miranda que lutou, direta ou indiretamente, pela libertação da maior parte das colônias espanholas (A Ação Secreta da Maçonaria na Política Mundial, CASTELLANI, p. 37).

Vê-se que se trata de um passado glorioso, ainda que contestável em seus detalhes.

Mas e o maçom atual? Mais especificamente, e o maçom brasileiro atual? É possível constatarmos o exercício político de algum maçom que nos salte aos olhos? Existe literatura maçônica vasta e estabelecida sobre o tema? Ou, como estamos acostumados a concordar, a Maçonaria brasileira realmente se distanciou da política, a ponto de se demonstrar incapaz de fugir do senso comum “direita x esquerda” em seus posicionamentos? É sobre isto que trataremos neste ensaio, apresentando como proposta o libertarismo ou libertarianismo, como alguns preferem, como ideal que coaduna com os princípios maçônicos de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, tendo florescido na França e nos EUA, onde a Maçonaria exerceu papel protagonista nas revoluções em defesa de tais princípios.

Cenário Atual

Lá se vão quase três séculos quando o clérigo James Anderson escreveu suas constituições, afastando os debates políticos e religiosos das Lojas Maçônicas. No entanto, a despeito do evidente e feliz desrespeito à essa norma por parte dos maçons ilustres supra mencionados, os maçons brasileiros atuais a seguem quase que religiosamente, ao mesmo tempo em que se vangloriam da filiação maçônica de tais revolucionários.

Ainda nesse sentido, apesar de termos no Rito Escocês Antigo e Aceito, o rito com o maior número de adeptos no Brasil, verdadeiras convocações à luta política contra déspotas e tiranos, prevalece a completa inanição por parte da Maçonaria brasileira.

Mas seria essa omissão deliberada? Talvez não. Vê-se muita vontade, bastante disposição, mas pouco preparo. Veem-se maçons “atirando para todos os lados”, o que só evidencia um ponto: o maçom brasileiro não entende de política. Ao que tudo indica, o maçom brasileiro nutre poucos ou incompletos conceitos relativos aos contextos necessários ao debate político e acaba por pecar, muitas vezes miseravelmente, naquilo em que deveria, em nome do passado político glorioso da instituição, ser exemplo e destaque para a sociedade.

Vejam, por exemplo, o “Posicionamento da Maçonaria perante o Povo Brasileiro” declarado pela Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil – CMSB, no qual, diante das manifestações populares ocorridas em 2013 e após profunda deliberação de seus membros, fez uma lista de “exigências”, até certo ponto compatíveis com bons e autênticos anseios populares e até com os princípios de liberdade e igualdade, como o voto distrital, a descentralização do poder executivo, o fim de foros privilegiados, entre outras. No entanto, o documento insistiu na cobrança de mais financiamentos para serviços públicos, como a saúde, educação e segurança, legitimando o conceito profundamente disseminado em nossa cultura de que bens e serviços podem configurar “direitos naturais” dos cidadãos e que, portanto, o Estado seria o fornecedor ideal desses serviços. Isso demonstra como o brasileiro acaba por adotar o sistema paternalista no qual viveu nos últimos séculos como uma verdade absoluta, tendo dificuldades de visualizar um sistema diferente, em que os cidadãos assumem maior responsabilidade perante a sociedade. Em defesa de tal responsabilidade individual, o político norte-americano Ron Paul manifestou-se da seguinte forma:

O suposto direito à assistência médica só pode ser assegurado a alguém à custa de outras pessoas. Essa transferência só é possível através do uso da força. E ela cria burocracias opressivas, encoraja o uso exagerado de recursos e leva à estagnação tecnológica e, inevitavelmente, ao racionamento e restrições. (RON ERNEST PAUL. Definindo a Liberdade. Tradução de Tatiana Villas Boas Gabbi e Caio Márcio Rodrigues. São Paulo: Instituto Von Mises Brasil, 2013, p. 41)

Já a “Carta ao Senador Aécio Neves”, assinada pelo Eminente Grão Mestre Estadual do Grande Oriente de São Paulo Mário Sérgio Nunes da Costa, motivada por uma palestra proferida pelo pré-candidato à Presidência da República em evento maçônico de grande porte, organizado pelo GEAP (Grupo Estadual de Ação Política da Maçonaria Paulista), onde se destacam, também, os acertados apoios ao fim do voto obrigatório, ao fim da reeleição, mas, por sua vez, “escorregando” com o apoio ao voto distrital misto, que manteria, ainda que em menor proporção, o problema atual de se votar num candidato e se eleger outro (lembrando que a CMSB optou por defender o voto distrital na íntegra), à fidelidade partidária e todo o engessamento de candidaturas, que não são compatíveis com nenhum princípio de liberdade e ao financiamento público de campanhas, que soa bem intencionado, mas que, assim como em todos os outros aspectos, configuraria apenas mais impostos para os cidadãos. Isso tudo num contexto de:

O Povo não quer reformas que solapem seu direito à livre escolha e concentrem todo Poder nas mãos de um punhado de “chefes” partidários; ou que cerceiem a liberdade de representação das minorias, cassem o direito à livre expressão, ampliem privilégios dos mais fortes ou que asfixiem economicamente os pequenos.”[1]

Mais incoerente, impossível. O direito à livre escolha ainda é solapado pelo voto distrital misto, a concentração do poder nas mãos de um punhado de chefes partidários se manteria intacta e a liberdade de representação das minorias continuaria cerceada pela falta de liberdade de se criar partidos políticos.

O maçom talvez seja o elemento da sociedade que mais fala sobre liberdade, mas o que se pode observar é que ele pode ser um dos que menos a compreende.

Sobre o direito à saúde

Todos têm o direito de procurar agir de maneira a conservar sua saúde, tanto mental quanto física, desde que não atente contra a saúde e bem estar de terceiros, assim como os terceiros não podem cercear essa sua prerrogativa. Isto é liberdade. Não significa, de modo algum, que, apenas pelo fato de termos nascido e sido inseridos no mundo, que o mundo tenha qualquer obrigação de proporcionar todo um aparato, toda uma estrutura para nos manter vivos.

Para algumas pessoas, ter o direito a vida inclui ter o direito a receber ao menos as necessidades mínimas suficientes para se continuar vivo. Mas suponham que o que na verdade é o mínimo suficiente que um homem necessite para continuar vivo seja algo que ele não tenha nenhum direito de receber? Se eu tenho uma doença terminal e a única coisa que irá salvar minha vida é o toque da mão gélida de Henry Fonda em minha testa febril, então ainda assim, eu não tenho o direito de receber o toque da mão gélida de Henry Fonda em minha testa febril. Seria extremamente gentil da parte dele voar da costa oeste para me prover isto, mas eu não tenho absolutamente nenhum direito ante qualquer um que ele deveria fazer isso por mim. Em resumo, é inadmissível interpretar o termo “direito a vida”, para conceder a alguém um direito de compelir a ação de outra pessoa para prolongar aquela vida. Em nossa terminologia, tal direito seria uma violação inadmissível do direito de auto-propriedade de outra pessoa. Rothbard, Murray N. (A Ética da Liberdade / Murray N. Rothbard. – São Paulo:Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. Página 161)

Partindo desse pressuposto, nenhum sujeito que adquiriu conhecimentos e habilidades médicas é obrigado a nos socorrer. Ele o faz por qualquer outro motivo, por convenção ética da categoria, porque o oferecemos uma contrapartida financeira, uma motivação especial, mas não porque exista tal direito de nossa parte.

Um indivíduo ter direito à vida não significa que ele tem o direito de ser mantido vivo por outras pessoas, contra a vontade delas. Se houvesse tal direito, então, por definição, você, eu e todas as pessoas que não são miseráveis teríamos de estar dedicando toda a nossa vida à inesgotável tarefa de manter vivas um incontável número de pessoas miseráveis ao redor do mundo. Porém, ao contrário, o direito à vida significa o direito de que ninguém tire a sua vida; significa também que o indivíduo tem o direito de empreender todo e qualquer tipo de ação, desde que pacífica e não coerciva, para sustentar e melhorar a sua vida. Essa compreensão do que realmente é o direito à vida é incompatível com a noção de pessoas terem o direito de serem mantidas vivas à custa de outras.[2]

Um indivíduo se alimenta mal, é sedentário e negligente com sua própria saúde e quando o corpo clama por cuidados, os outros é que são os responsáveis? Onde está a racionalidade desse conceito?

Não se defende aqui que, por exemplo, uma criança que veio ao mundo não mereça qualquer cuidado. É evidente que seus pais possuem uma obrigação ética de cuidar dessa criança e é óbvio que qualquer um é livre para cuidar dessa criança, se quiser. Mas, ainda assim, isso não configura um direito, em si, da criança. Defender o aumento da porcentagem do orçamento público destinada aos serviços de saúde é defender apenas o que, historicamente, o serviço público se tornou: corrupto, ineficiente e negligente.

Sobre o direito à educação

O mesmo ocorre com a educação. Os pais são moralmente compelidos a educarem seus filhos, mas não há lógica que justifique o “direito à educação” defendido pela CMSB e GEAP. Novamente, somos livres para buscarmos conhecimento, desde que não iniciemos qualquer tipo de ação ilegítima contra os demais cidadãos e sem que ninguém nos importune. Mas os outros são obrigados a nos passar seus conhecimentos? Nós temos o direito de receber conhecimento compulsoriamente? Isso não deveria ser de livre e espontânea vontade dos portadores do conhecimento? Ou se lhes oferecemos uma contrapartida atrativa que seja suficiente para lhes convencer a nos transmitir seus ensinamentos? A partir de que momento esse direito se constituiu?

Defender políticas públicas de educação, como fazem CMSB e GEAP é demonstrar completa inaptidão para responder à esses questionamentos.

Como pais, não pensamos em coagir nosso vizinho para que ele contribua para a educação de nossos filhos. Porém, como membros de um organismo político, recorremos à tributação com o intuito de coagi-lo a financiar a educação de nossos filhos, de modo que eles tenham educação pública, gratuita e de qualidade. De quebra, isso faz com que nos sintamos liberados das nossas obrigações morais e pessoais para com nossos próprios filhos. Alguém que quisesse propositalmente criar uma sociedade de pais indolentes e negligentes dificilmente teria uma ideia melhor. (Hans F. Sennholz. Two Yardsticks of Morality. The Freeman, 1996.)

Serviços de saúde e educação não são direitos, são bens.

A grande questão é: o maçom brasileiro tem essa noção de que todo esse sistema é sustentado pelo espólio de recursos alheios? Pelo espólio de seus próprios recursos? Impostos, como o próprio nome já diz, à despeito da opinião do contribuinte? Legitimados por um “contrato social” que ninguém assinou, onde o único jeito de nega-lo é saindo do país?

O maçom brasileiro certamente concorda com a ajuda ao próximo, essa prática está em suas bases:.

O prazer inconcebível de contribuir para o auxílio de nossos semelhantes, é verdadeiramente vivido por pessoas de uma disposição humana, que são naturalmente animados, pela simpatia, para estender a sua ajuda no alívio dos infortúnios dos outros. Isso incentiva o maçom generoso a distribuir sua generosidade com alegria. (…) embora aliviar o aflito é um dever de todos os homens, é mais particularmente ainda dos maçons, que estão ligados entre si por uma cadeia indissolúvel de afeto sincero. (Illustrations of Masonry, PRESTON, 1867, p. 28)

Mas o princípio dessa ajuda é que seja voluntária. É louvável, e eu apoio totalmente, qualquer trabalho beneficente, de cunho social e cultural, desde que, desempenhado com recursos próprios. Porém, infelizmente, o terceiro setor está dependente até o último fio de cabelo de emendas parlamentares. O maçom consegue estabelecer algum critério sobre quem ou o quê banca esse sistema? Aparentemente, não.

Isso demonstra como os maçons, vários deles entusiastas desse tipo de ação social, ignoram como todo o sistema funciona. Observa-se isso, claramente, também, nas críticas à sonegação. Um bandido, estelionatário, ladrão, e um sonegador, estão nivelados ao mesmo patamar de gravidade no conceito moral da maioria das pessoas, também dos maçons. Qual a lógica? Sonegar nada mais é do que não se submeter ao roubo institucionalizado. Uma lei, quando injusta, não temos apenas o direito, como o dever de desobedecê-la, essa é a interpretação vulgar para:

Consideramos estas verdades como sendo auto-evidentes: que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a busca da felicidade. Que, com o fim de assegurar esses direitos, governos são instituídos entre os homens, derivando seus justos poderes do consentimento dos governados; que, sempre que qualquer forma de governo se torne destrutiva de tais fins, é direito do povo alterá-la ou aboli-la e instituir novo governo, baseando-o em tais princípios e organizando-lhe os poderes da forma que lhe pareça mais conveniente para garantir-lhe a segurança e a felicidade. (Thomas Jefferson na Declaração da Independência dos EUA)

Não se pretende fazer nenhuma apologia à desobediência civil e à contravenção, apenas se constata a natureza das coisas. Roubar é errado, mas o Estado faz isso e chama de “imposto”. Isso é um fato. Sonegar é quase uma obrigação moral. Mas quantos maçons concordam com minha observação? Poucos.

Que liberdade é essa que os maçons defendem? Os maçons que revezam nas caronas para se dirigirem às reuniões estão cometendo infração de trânsito. Eles sabem disso? Eles concordam com essa lei? O maçom que não usar cinto de segurança não está fazendo mal à uma mosca, à ninguém, além dele mesmo, mas paga multas pesadas por essa infração. Que liberdade é essa? O maçom que desejar se candidatar à um cargo público precisa, necessariamente, se filiar à um partido político, (entidade sabidamente eivada de comportamentos nocivos e incompatíveis com qualquer noção de probidade à qual o maçom está acostumado). Precisa se impor e convencer os dirigentes desse partido de que ele é um nome forte para disputar as eleições e se envolver nas mais repugnantes negociações para tornar viável sua eleição pelo tal partido e, depois de tudo isso, estará completamente impossibilitado de defender qualquer tipo de princípio que julgue correto. Tudo será pautado pelo partido, que é detentor dos mandatos. Onde está a liberdade? Onde está a democracia?

Além disso, o mais importante: onde estão os maçons a lutar contra tudo isso? Onde está a defesa desses princípios de liberdade? Simplesmente não existem. Os maçons ainda estão na fase de serem convencidos desses conceitos libertários, os de liberdade.

E a tarefa para atingir essa unidade será árdua. Vê-se maçons defendendo com unhas e dentes a existência plena de Estado e da tutela estatal, muitos desses funcionários públicos. Vê-se maçons defendendo a ditadura militar. Tem-se toda uma estrutura maçônica voltada a julgar e punir indisciplinas maçônicas e corpos maçônicos legislativos deliberando sobre essas regras punitivas. Vê-se maçons falando sobre ofensas e processos por calúnia e difamação. Vê-se até mesmo maçons que chamam corruptos, condenados pela justiça, de heróis nacionais.

Convencer de que Estado não é tão necessário, que é coercitivo, que ninguém não inimputável precisa de tutela, que as pessoas devem ser livres para expressarem pensamento e poderem ser proprietárias daquilo que adquirirem legitimamente, não parece difícil, pela obviedade das questões. Mas é. Estão culturalmente enraizados no íntimo das pessoas os conceitos de função social da propriedade privada e os seus direitos à ofensa, à um emprego, à uma casa, a tratamento médico, educação e segurança e à tutela estatal.

“De que me adiantará a liberdade, se me faltar a razão?”[3]

O libertarianismo nada mais é do que a defesa de relações humanas voluntárias, pacíficas e legítimas. Sem coerção, sem privilégios injustos e sem agressão e/ou violência. É a presunção da liberdade nas relações humanas. O libertarianismo afirma que a única função adequada da violência é defender o indivíduo e sua propriedade contra a violência iniciada por terceiros, e que qualquer uso da violência que vá além dessa legítima defesa é por si só agressiva, injusta e criminosa.

O libertarianismo defende que a existência do Estado deve ser mínima e justificável, caso contrário, o Estado não teria razão de existir. Mas porquê? Porque a ideia de Estado presume uso da força, uso de poder letal. Portanto, é o exercício do poder, e não o exercício da liberdade, que requer uma justificativa.

Libertarianismo significa respeitar a autonomia moral de cada pessoa, respeitar a soberania das decisões que cada pessoa toma sobre sua própria vida, desde que, essas decisões não afetem diretamente a vida ou as decisões de outros (ROTHBARD, 2013).

Direitos Individuais

Um dos princípios fundamentais do libertarianismo é o conceito de “Direitos Individuais”. Direitos Individuais não são “dados” pelo Estado, eles não são “dados” pela Constituição (algumas Constituições apenas os garantem). Alguns diriam que são provenientes de Deus, outros da natureza selvagem, mas o fato é que sua natureza é indeterminável. Eles existem porque existem. Sempre existiram, quer a pessoa tenha existido, quer não. Eles fazem parte de nós enquanto indivíduos. Também é impossível listar quantos são. O direito de comer fastfood, de beber, ou de se alimentar apenas com vegetais e de se drogar, desde que isso não incomode ou ofereça riscos à terceiros. Não se trata do “direito” à receber tratamento médico gratuito. O primeiro é legítimo, diz respeito apenas ao indivíduo, que pode fazer tudo isso sem incomodar ninguém, nem iniciar qualquer ação ilegítima contra alguém. O segundo depende do financiamento de uma estrutura capaz de atender tal demanda. Depende de recursos que podem ou não existir. Quem financiará? Como já foi dito, os pais são moralmente responsáveis pelos seus filhos. Mas o são, também, pelos filhos dos outros? O são, também, pelos outros? Novamente, não se quer impedir, desacreditar ou deslegitimar que as pessoas que desejam ajudar aos próximos, assim o possam fazer. O ponto é outro. Trata-se apenas de estabelecer o que é direito natural ou não.

Trabalho, comida, roupas, recreação, lares, cuidados médicos, educação, etc. não crescem na natureza. São valores produzidos pelo homem – bens e serviços produzidos pelo homem. Quem irá provê-los?

Se alguns homens estão intitulados por direito aos produtos do trabalho de outros, isto significa que estes outros estão privados de seus direitos e condenados ao trabalho escravo.

Qualquer “direito” alegado de um homem que necessite da violação dos direitos de outro não é e não pode ser um direito.

Nenhum homem pode ter o direito de impor uma obrigação não escolhida, um dever não recompensado ou uma servidão involuntária em outro homem. Não pode existir tal coisa como “o direito de escravizar”.

Um direito não inclui a implementação material daquele direito por outros homens; inclui apenas a liberdade de adquirir tal implementação por seu próprio esforço.

Observe, neste contexto, a precisão intelectual dos Pais Fundadores; eles falaram do direito da busca pela felicidade – não ao direito à felicidade. Isto significa que o homem tem o direito de tomar as ações que ele julgar necessárias para alcançar a felicidade; isto não significa que outros devem fazê-lo feliz.

O direito à vida significa que o homem tem o direito de sustentar sua vida por seu próprio trabalho (em um nível econômico, tal qual seja possível de acordo com suas habilidades); isto não significa que outros devem provê-lo com as necessidades da vida.

O direito à propriedade significa que um homem tem o direito de tomar as ações econômicas necessárias para adquirir propriedade, de usar e dispor dela; isto não significa que outros devem provê-lo com propriedade.

O direito à livre expressão significa que o homem tem o direito de expressar suas ideias sem perigo de supressão, interferência ou ação punitiva do governo. Isto não significa que outros devem provê-lo com um salão de palestras, uma estação de rádio ou uma máquina de impressão através da qual ele possa expressar suas ideias.

Qualquer empreendimento que envolva mais de um homem requer o consentimento voluntário de cada participante. Cada um deles tem o direito de tomar sua própria decisão, mas nenhum deles tem o direito de forçar sua decisão aos outros.

Não existe tal coisa com um “direito a um emprego” – há apenas o direito ao livre comércio, que significa: o direito de um homem de aceitar um emprego se outro homem decidir contratá-lo. Não há o “direito a uma moradia”, apenas o direito de livre comércio: o direito de construir ou comprar uma casa. Não há o “direito a um salário ‘justo’ ou um preço ‘justo’” se ninguém decidir pagá-lo, contratar alguém ou comprar seu produto. Não há o “direito dos consumidores” a leite, sapatos, filmes ou champanhe se nenhum produtor escolher manufaturar tais itens (há apenas o direito de manufatura-los por si mesmo). Não há o “direito” de grupos especiais, não há o “direito dos fazendeiros, trabalhadores, empresários, empregadores, empregados, velhos, jovens ou não-nascidos”. Há apenas os Direitos do Homem – direitos possuídos por cada indivíduo e por todos os homens como indivíduos. (Ayn Rand. Capitalism: The Unknown Ideal, Signet, 1983, 416p.)

O direito de estudar o catolicismo, mesmo pertencendo à uma comunidade protestante. O direito de procurar quem ensine, de financiar por conta própria esses estudos. Isso é inalienável. Não o “direito” de frequentar uma instituição que, em teoria, é responsável pelo ensino. O primeiro é prerrogativa do indivíduo e à ninguém cabe cerceá-la. O segundo, novamente, depende de terceiros, depende de obrigar outras pessoas a financiar a logística e gestão dessa tal instituição.

Como saber, então, se um direito é legítimo? Basta analisar se, na consecução do mesmo, alguém foi indevidamente afetado.

Se quisermos avaliar se um determinado direito, um suposto direito, é de fato um direito genuinamente válido — isto é, um direito natural, um direito que todos nós como seres humanos usufruímos pela simples virtude de sermos humanos —, então é necessário fazermos um teste crítico e logicamente irrefutável, qual seja: todos nós temos de ser capazes de usufruir esse mesmo direito, ao mesmo tempo e da mesma maneira. Apenas assim esse direito pode ser natural. A obviedade dessa afirmação vem do fato de que, para um direito ser natural, seu usufruto não pode levar a nenhum conflito ou a nenhuma contradição lógica.[4]

O direito de comprar, e possuir, o que se quer. O direito de vender, e de transferir a posse, do que se quer. O direito de vender sua ideia, ou mesmo sua mão-de-obra. O direito de se associar com outras pessoas com intuitos legítimos e benéficos aos envolvidos (desde que, novamente, nenhum terceiro seja prejudicado). O direito de se defender de uma agressão. O direito de falar ou expressar o que pensa. Nada disso afeta ninguém além do próprio indivíduo.

Porém, eles só serão possíveis por um único fator: a liberdade. Chega-se, então, ao ponto que legitima a existência do Estado: proteger os Direitos Individuais. Se eu sou uma pessoa pacífica e me deparo com um elemento da sociedade totalmente alheio às noções de direitos individuais, e o mesmo me agride deliberadamente, ou me toma um bem e assim o faz com todos os que encontra, eu e essas pessoas pouco temos a fazer. Pessoas pacíficas têm o direito de instituir algum mecanismo que as proteja desse tipo de situação. É aí, e somente aí, que um Estado se faz necessário. Primeiro, para, através do uso da força, interromper as ações do agressor, segundo, para julgar o agressor e, terceiro, para puni-lo. Evitando, assim, que esses crimes continuem. E, acreditem, há libertários mais radicais que defendem que, mesmo juízes, mesmo forças policiais podem ser providos pelo livre mercado.

Considerações Finais

Libertarianismo se aprende logo no jardim de infância: “Não bata nos outros”. “Não tome as coisas dos outros”. “Cumpra suas promessas”. “Fale sempre a verdade”. “Seja educado e cortês”.

Apesar de nós, maçons, conhecermos e praticarmos esses conceitos, a já citada falta de preparo, de leitura, de estudo filosófico, coloca o maçom a criticar um problema ao mesmo tempo em que legitima a origem do mesmo, ignorando o fato de que essa origem vai de encontro à tais conceitos. O libertarianismo abrange mais aspectos, principalmente o econômico, abordando outro conceito protagonista que é o de livre mercado, que é o que proveria os bens e serviços que vários maçons demonstram crer plenamente que seja incumbência do Estado, porém, paro por aqui, crendo que consegui fazer uma introdução satisfatória sobre esse preocupante cenário que nossa fraternidade apresenta. Talvez James Anderson nem seja o principal culpado. A cultura do “política, religião e futebol não se discute” foi apresentada e assimilada à cada um dos maçons, enquanto indivíduos, bem antes que as Constituições de 1723. Precisamos debater, sim, e precisamos melhorar nossos posicionamentos políticos, pois, melhorar, sempre será possível, sob qualquer aspecto.

Assumi como minha a missão disseminar o conteúdo libertário no meio maçônico e espero ter, pelo menos, colocado uma pulguinha atrás da orelha de cada leitor, me colocando à disposição para o debate.

Autor: Rodolfo A. Germano

Fonte: Revista Fraternitas in Praxis

Rodolfo é empresário contabilista, Mestre Maçom da Loja Maçônica “Deus, Justiça e Amor”, n°2086 do Oriente de Sumaré/SP (GOB/GOSP) e Maçom do Real Arco pelo Capítulo Grande Campinas, jurisdicionado ao SGCMRAB.

Notas

[1] –  GEAP  Grupo Estadual de Ação Política (Em carta ao Senador Aécio Neves, Abril/2014)

[2] – George Reisman (Ph.D e autor de Capitalism: A Treatise on Economics. Texto publicado em seu blog: georgereismansblog.blogspot.com)

[3] – Zorobabel (Ritual do Grau 15 “Cavaleiro do Oriente, da Águia e da Espada do Rito Escocês Antigo e Aceito)

[4] – Woods, Thomas E. Jr.(Transcrição do vídeo “Is There a “Right” to Health Care? Is Income Taxation Just?” que pode ser acessado em: http://www.tomwoods.com/)

Referências Bibliográficas

CASTELLANI, José. A Ação Secreta da Maçonaria na Política Mundial. São Paulo: Ed. Landmark, 2007. CMSB (Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil) – “Posicionamento da Maçonaria perante o Povo Brasileiro” – 09/07/2013 GEAP – Grupo Estadual de Ação Política da Maçonaria Paulista – “Carta do Eminente ao Senador Aécio Neves” – Abril/2014 PAUL, R. E. Definindo a Liberdade. Tradução de Tatiana Villas Boas Gabbi e Caio Márcio Rodrigues. São Paulo: Instituto Von Mises Brasil, 2013. PRESTON, William. Illustrations of Masonry. New York: Masonic Publishing and Manufacturing Co., 1867. RAND, A. Capitalism: The Unknown Ideal, Signet, 1983. ROTHBARD, M. N. A Ética da Liberdade. São Paulo:Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. ROTHBARD, M. N. O Manifesto Libertário: Por uma nova liberdade. Instituto Ludwig Von Mises Brasil, 2013 SENNHOLZ, H. F. Two Yardsticks of Morality. The Freeman, 1996.

 

Fonte: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/

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